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De bodes expiatórios a vacas de leite: aposentados do INSS 

Por Carlos Alberto, professor, radialista e mestre de cerimônias e Pedro Torres Filho, engenheiro agrônomo

27/05/2025 08h33 Atualizada há 8 horas
Por: Hely Beltrão Fonte: Conectado News
Agencia Brasil
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O QUE DISSERAM

Sempre se ouviu falar que a previdência pública está em crise e é ‘a grande responsável pelas mazelas do governo', ou melhor, do Estado brasileiro. Ano após ano as manchetes dos principais meios de comunicação estamparam que ‘o rombo da previdência é de bilhões e os aposentados são os responsáveis por tudo de ruim que ocorre na economia’. Tudo isso com desdobramentos para os demais segmentos da máquina pública.

Também se ouviu dizer que a previdência pública no Brasil enfrenta desafios significativos, incluindo déficits financeiros, fraudes e problemas de gestão. A última reforma da previdência ocorrida em 2019, inclusive, foi considerada por muitos com ‘parcial e insuficiente para resolver a “crise”’. Disseram, também, que a pressão demográfica, com a população envelhecendo e a redução da taxa de natalidade e de contribuintes, também fez acrescer o problema.

Diante deste cenário, entre outras alegações, metas deixaram de serem cumpridas, obras não foram realizadas; aumento real do valor do salário mínimo? Nem pensar, diziam economistas do(s) governo(s). Fica impraticável com o rombo da previdência, afirmavam categoricamente. Nessa mesma linha de raciocínio, o funcionalismo público sempre foi sacrificado, especialmente, quando o assunto diz respeito a reajuste de salário, reposição salarial.

‘Aposentado é a praga deste país’, afirmavam - e ainda afirmam alguns. ‘Assim não é possível governar’, ouviu-se muito dizer. Propuseram soluções ainda mais perversas para quem contribuiu por muito tempo vislumbrando um futuro de calmaria. Aumentaram a idade mínima para se requerer a aposentadoria - em diversas categorias e por gênero -; reduziram valores de aposentadorias; tiraram benefícios, muitos já incorporados; limitaram ao máximo o que puderam naquela última reforma.

POR TRÁS DA CENA
De repente, não mais que de repente, como num passo de mágica, banqueiros e suas respectivas instituições de crédito passaram a enxergar no aposentado fonte garantida [e segura] para se obter lucros. Eis que surgem os empréstimos consignados. Bastavam ser publicadas portarias concedendo aposentadorias, começavam as ligações para os mais novos aposentados oferecendo empréstimos, todas com ofertas tentadoras de "dinheiro fácil” em longo prazo.  

Cientes ou não, muitos aposentados embarcaram nessas operações financeiras. E como dizem que ‘alegria de pobre dura pouco’, logo nos meses subsequentes à contratação desses empréstimos os descontos em contracheques mostravam outra realidade. Assim, a vida dos aposentados a cada ano vem ficando ainda mais apertada: salários congelados; inflação alta para os que estão na base da pirâmide social; remédios, que, além de caros, sofrem aumentos nas prescrições médicas, enfim, tudo isso tem tornado a vida - de idosos e aposentados - ainda mais difícil, para não dizer penosa.

Pongando no vácuo dos agentes financeiros surgem outras instituições também inescrupulosas: as associações e sindicatos que, idênticos aos anteriores [agentes financeiros] veem na categoria aposentados uma fonte de recursos para desvios fraudulentos e enriquecimento ilícito. Assim como nos empréstimos consignados, que às vezes são liberados sem o devido consentimento dos aposentados, as contribuições para associações e/ou sindicatos, em muitos casos seguiam a mesma praxe. 

E todas essas maracutaias ora contaram com a participação de pessoas, também inescrupulosas, ligadas a agentes financeiros, associações, sindicatos e até do próprio Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), segundo apurado até aqui pela Polícia Federal e Ministério Público. Apurações reveladas até o momento dão conta que a mais recente fraude no INSS ultrapassa os seis bilhões de reais.

INVESTIGAÇÕES
O esquema de fraudes no INSS veio a público em razão da apuração da Controladoria Geral da União (CGU), que levou o caso até a Polícia Federal para que a situação fosse apurada. Conduzida pela Polícia Federal, a Operação Sem Desconto teve início em abril deste ano e revelou um esquema de cobranças indevidas aplicadas sobre benefícios do INSS. As investigações têm revelado, até aqui, que entidades de classe realizavam descontos sem autorização dos beneficiários, valendo-se de acordos de cooperação técnica firmados com o instituto.

Desde o início das investigações e da divulgação das apurações, é de conhecimento público que a recente crise no INSS tem chamado à atenção e repercutido muito, não somente entre os prejudicados - os aposentados -, mas, sobretudo, no mundo político. Diante das investigações, até aqui, a PF afirma que as fraudes recentes no INSS iniciaram em 2019 - não se sabe ao certo, pode ter sido muito antes - e continuaram até agora em 2025, com o  início das investigações somente em 2024.

NARRATIVAS
De um lado, o presidente Jair Bolsonaro, mesmo tendo admitido em recente entrevista à imprensa a possibilidade de as fraudes no INSS terem começado durante seu mandato, se limitou a dizer, no entanto, que ‘o esquema ganhou maior proporção no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT)’. Bolsonaro disse, ainda, ser ‘difícil garantir uma administração com zero absoluto de corrupção’. Ou seja, mesmo tendo sido alertado, em 2019, sobre possíveis descontos fraudulentos no INSS, o governo Bolsonaro nada fez para que o alerta fosse apurado.  

No atual governo, segundo noticiado, o ex-ministro da Previdência Social, Carlos Luppi, fora também alertado sobre a continuidade dos descontos indevidos, acredita-se que duvidou, pois sendo o presidente do INSS, Alessandro Stefanutto, indicado de Luppi e homem de sua mais absoluta confiança, não adotou as providências cabíveis e necessárias na época. O fato é que não se apurou no ‘início’ - no governo Bolsonaro - e demorou muito para apurar agora, no governo Lula, e as fraudes só se avolumaram, prejudicando ainda mais quem sempre mereceu respeito e cuidados, os aposentados.

Dizendo-se “preocupada” com a situação dos aposentados, a oposição não tem feito outra coisa no Congresso Nacional senão colher assinaturas para instalação de Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI), pleito alcançado no que diz respeito ao número legal de assinaturas. Do outro lado, o governo federal tenta a todo custo evitar a instalação da CPMI, segundo dizem, não temendo as investigações, pois a PF continua apurando, mas, para evitar o desgaste do governo.

Seja como for, narrativas a parte, investigação ocorrendo pela PF, pela CPMI, por quem quer que seja, espera-se que a verdade venha à tona, que os culpados sejam punidos e que os valores descontados indevidamente - dos aposentados, por quem quer que os tenha feito - sejam estornados aos verdadeiros donos por quem lhes descontou indevidamente. E mais, que medidas duras sejam adotadas pelos poderes/órgãos competentes para que isso não volte a acontecer. 

Até porque eles - os aposentados - passaram de bodes expiatórios a vacas de leite. E muito leite. Para muita gente (agentes, associações, sindicatos...) inescrupulosos.

 

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