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Quem fala por você?

"Eles apanhavam bastante. Qualquer coisa que estivesse errada, apanhava. Nós do Sul não apanhávamos", revelou, em entrevista ao UOL, o funcionário que não quis se identificar.

07/03/2023 13h53
Por: Hely Beltrão Fonte: Conectado News
Foto: TV Câmara Caxias/Reprodução
Foto: TV Câmara Caxias/Reprodução

Existe um autor francês que numa ocasião explicou a uma plateia atenta sobre a influência do discurso e daqueles que ocupam o lugar de poder que é o local de discursar. Milton Santos, um homem negro e intelectual baiano, chamou de intelectuais da palavra, aqueles que como os jornalistas, radialistas, professores, pastores, padres constroem narrativas e discursos para serem ouvidos seja por uma turma em sala de aula, ou uma multidão em praça pública.

O poder da palavra dita de um lugar de poder como o púlpito, um palco, a bancada de um telejornal ou a tribuna de uma Câmara Municipal pode formar opiniões e mobilizar multidões ao redor do mundo. Em um mundo onde a informação circula em alta velocidade e as palavras ganham cada vez mais alcance e poder, cada discurso, crítica ou palestra que é veiculada por aí, podem ter alcance inimagináveis.

Principalmente quando esse discurso é proferido por um homem branco de poder político, em um local de poder público que é a tribuna da Câmara Municipal, e sendo esse discurso transmitido via internet e gravado para posterior consulta, caso necessário. 

Quando um vereador branco do sul do país, se coloca publicamente na tribuna da câmara municipal de uma cidade sulista, vociferando um discurso repleto de uma visão de mundo baseada em mitos e piadas racistas, para criticar a luta por liberdade de homens negros e pobres baianos, trabalhadores que mais uma vez na história desse país tiveram que resistir a escravidão imposta aos afrodescendentes por homens brancos descendentes de Europeus, entendemos que este homem, usa seus instrumentos de poder para levar seu discurso a favor da permanência da escravidão aos 4 cantos do mundo.

Mas essas ideias não nascem sozinhas, elas são produzidas culturalmente pelas pessoas em sociedade, elas nascem a partir dos diversos grupos sociais que compartilham experiências e da relação desses grupos com a realidade em que estão inseridos. Ou seja, sabemos que os vereadores não são representantes de si mesmos, não governam para si, eles são eleitos por uma base que em muitos casos concorda com a visão de mundo e com os discursos proferidos pelo edil que eles elegeram, daí as bases evangélicas, do agronegócio, bolsonaristas, petistas, carlistas, etc…

Por isso, é importante considerar que esse vereador, inclusive sendo um homem branco, não estava falado apenas por si, ele estava falando pela sua base, ou seja, as pessoas que o elegeram e conhecem seus posicionamentos, uma base que se sentiu prejudicada com a libertação de mais de 200 trabalhadores negros e pobres baianos escravizados. 

Mas e por você, baianos negros e pobres quem fala por você? 

Por: Valter Zaqueu, Professor Mestre e Doutorando em História 

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