No próximo domingo (2), é comemorada a independência da Bahia, data em que enche de orgulho a maioria dos baianos, pois foi aqui que se consolidou a independência do Brasil. Aos feirenses, por lembrarmos de Maria Quitéria, que se vestiu como homem para lutar no exército e mesmo após descoberta foi mantida devido a sua habilidade no manejo de armas e combate corpo a corpo.
Em entrevista concedida na manhã desta sexta (30) à jornalista Emanuelle Pilger, do Programa Primeira Página da Rádio Povo FM, o historiador Paulo Cesar Oliveira de Jesus, conta maiores detalhes de como se deu todo o processo.
"A independência do Brasil e sua consolidação na Bahia é um dos capítulos da história do nosso país que merece a nossa maior atenção, poucas pessoas sabem que o 07 de setembro de 1822 não concretizou a nossa separação de Portugal, em várias partes do Brasil, especificamente no Nordeste e no nosso caso na Bahia, a consolidação da independência foi resultado da luta muito forte e do engajamento de vários setores da sociedade para que pudéssemos concretizar a libertação do Brasil com a separação definitiva de Portugal, que em nosso caso, ocorre com a saída das tropas portuguesas no dia 2 de julho de 1823 e comemoramos agora o bicentenário da independência do Brasil na Bahia, é preciso levar em conta que Feira de Santana, Cachoeira e toda a região do Recôncavo e do sertão da Bahia tiveram uma participação importantíssima no processo da Independência, fosse enviando homens, mulheres, armas, alimentos, mantimentos, para que os integrantes do exército pacificador pudessem enfrentar as tropas portuguesas, isso nos traz um sentimento muito grande de alegria por entender que a participação popular, homens, mulheres, negros livres e escravizados foi fundamental para que este acontecimento pudesse se dar em solo baiano", disse.
Paulo Cesar comenta sobre outros personagens importantes na luta pela independência além de Maria Quitéria.
"Existem inúmeros, muitos dos quais continuam desconhecidos, ainda que de alguma maneira saibamos que Maria Quitéria teve um papel fundamental, poucas pessoas sabem que outras inúmeras mulheres também participaram da guerra e que ainda não tiveram seu reconhecimento devido, por exemplo, Maria Felipa que teve um papel destacado na resistência aos portugueses na Ilha de Itaparica, José Antônio da Silva, o periquitão, que seria avô de Castro Alves, que teve um papel importantíssimo nessa batalha, também não temos muitas informações sobre o 2º tenente da Armada Nacional, o qual chamamos de João das Botas, que teve papel fundamental nas lutas no Povoado de Nazaré, pouco falamos do índio Bartolomeu, que era conhecido como Jacaré, que chefiou uma tropa de índios oriundos da região que hoje chamamos de Massarandupió, que teve uma tropa que teve as ações integradas a Companhia da Casa da Torre em Dias D’Avila, citei alguns poucos para demonstrar o quanto ainda precisamos investir em pesquisas, estudos e investigações para que tenhamos no futuro a constituição de um panteão, que represente os verdadeiros heróis do Brasil na Bahia, reiterou.
Quem foi Maria Quitéria?
"Maria Quitéria é uma mulher que nasceu ali na freguesia de São José, que na época eram campos da Cachoeira, mais tarde, Feira de Santana, ela teria nascido em julho de 1798, ela filha de Gonçalo Álvares de Almeida e Quitéria Maria de Jesus, que deixou a fazenda do seu pai por ter ouvido falar dos rumores de um recrutamento, se deslocou até a Vila de Cachoeira, concentração do exército libertador e, trajando-se de homem conseguiu se alistar nas chamadas tropas que iriam lutar pela independência como voluntário, atuou com o nome de soldado Medeiros, participou do batalhão de voluntários do príncipe, chamado Batalhão dos Periquitos, não obstante, mesmo tendo se alistado como homem, logo foi descoberta, mas ainda assim foi mantida nos quadros do batalhão devido as suas habilidades de tiro e de fazer enfrentamento direto nas escaramuças que aconteceram".
Consolidação da independência se deu apenas na Bahia
"A Bahia reconhece efetivamente D. Pedro como defensor perpétuo ainda no ano de 1822, já reconhecido na Vila de Cachoeirinha em 25 de junho de 1822, mas, por conta da forte presença da Legião Portuguesa, que era um exército treinado, experimentado de guerra e que se recusava a admitir a autoridade do príncipe regente, uma grande luta se desenvolve entre 22 de junho de 1822 a 02 de julho de 1823, efetivamente podemos dizer que a consolidação da independência com a expulsão das tropas portuguesas ocorre em 02 de Julho de 1823".
O historiador concluiu, afirmando que, mesmo passados 200 anos da independência, muitos negros e descendentes ainda não tem de fato a cidadania reconhecida, e que o desconhecimento de outros personagens importantes se deu por causa dos nobres da época que fizera de tudo para alterar os registros históricos.
"Posso dizer que hoje reconheço que temos um estado, uma nação, somos brasileiros, é importante dizer que ser brasileiro significa, a partir de 1822 pertencer ao então estado do Brasil que nasce efetivamente dessas guerras em torno da libertação que conhecemos pelo 07 de setembro, reconheço que temos o estado brasileiro, uma república cuja democracia foi atacada recentemente, mas, digo que a independência não trouxe cidadania para a população negra, que são descendentes dos escravizados da África e para cá vieram. Posso dizer que o processo de independência compensar a nossa condição de hoje e associar ao processo de independência durante as lutas pela independência, a elite branca, grandes proprietários de terras e comerciantes, temiam a participação dos escravizados no processo de independência, por que esses escravizados associaram a condição de independência de Portugal e liberdade do Brasil, à sua própria condição de existência, essa elite foi muito hábil em não somente apagar dos registros históricos da participação dos escravizados e de seus descendentes, como também foi capaz de se organizar no pós independência e manter o então nascente estado brasileiro como regime escravista que continuou vitimando até 1888 um grande número de africanos que vieram para cá na condição de escravizados, a liberdade desses escravos só ocorre efetivamente em 1888, a despeito de terem participado ativamente no processo da luta de independência do Brasil, um grande contrassenso, você se liberta de Portugal dizendo que o Brasil estava sendo escravizado por Portugal e mantém a maioria da população no regime escravista, vejo como um grande desafio do Brasil incluir os descendentes desses escravizados no que entendemos como cidadania, muitos descendentes, homens e mulheres negros e mestiços nesse país ainda não tem cidadania plena, e isso está associado ao não entendimento de que fomos fundamentais inclusive no processo de independência do Brasil, por tanto, vejo com muita preocupação, acho importante trazer a tona esse debate, pois precisamos pensar um Brasil independente a partir da ampliação irrestrita da cidadania a todos aqueles que aqui residem", concluiu.
Ouça na íntegra em nosso podcast.
Reportagem: Emanuelle Pilger e Hely Beltrão
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