Durante todo o mês de novembro o Conectado News estará homenageando negros e negras, através de relatos de superação e luta contra o preconceito. Filhos e filhas da resistência é o nome dado ao conjunto dessas homenagens em forma de texto, e você só encontra aqui, no Conectado News.
Hoje, 05 de novembro, conheceremos a história de Andréia Araújo, que gentilmente, nos concedeu essa entrevista tão repleta de vida. Vem com a gente, no Filhos e filhas da resistência!
Andréia Silva de Araújo, 33 anos, trabalha com consultoria acadêmica, é professora universitária nas áreas de Literatura e Metodologia da Pesquisa. Está cursando Doutorado em Literatura e Cultura, pela Universidade Federal da Bahia, e nos contou um pouco da sua história: “as festividades de novembro nos dão uma falsa sensação de que muitos direitos já foram conquistados e a maioria dos problemas, no que concerne à população negra no Brasil, já foram resolvidos. Quando na verdade, nós ainda carecemos de políticas públicas que contemplem os direitos básicos de cidadania das pessoas negras, como também carecemos de meios de efetivação e melhoria das políticas públicas que já existem, a exemplo das políticas de cotas. Nós precisamos também trabalhar, no sentido de garantir, por exemplo, que os crimes de racismo e injúria racial, já previstos há um tempo considerável, sejam efetivamente passíveis de condenação e que a gente consiga, para além disso, mexer nas estruturas mais profundas, que permitiram e continuam permitindo o racismo e os grupos que continuam se beneficiando de práticas racistas.”
Sobre suas vivências e resistência aos preconceitos, Andréia disse: “não existe inspiração, existe uma necessidade de sobrevivência e uma consciência do lugar que se ocupa nesse tabuleiro, nas relações de poder demarcadas pela questão racial no Brasil. Então, ser negro no Brasil é uma luta cotidiana pela sobrevivência e pelo reconhecimento de direitos básicos. A briga fundamental de dizer ‘eu também sou ser humano, eu também sou cidadão, eu também sou um sujeitos de direitos e deveres, como qualquer outro e eu sobrevivo a uma estrutura que é pensada para o meu extermínio, que é pensada para o meu desprestígio e que é pensada para a minha exclusão. No meu ciclo geracional mais próximo sou a primeira pessoa da família a ir pra uma universidade. Eu consegui entrar antes da política de cotas, mas sou uma entusiasta da política de cotas, acho que precisa sim ser melhorada, a gente tem alguns pontos ainda que precisam ser sim discutidos e precisam ser problematizados, mas a gente precisa ainda de mais políticas públicas que garantam os direitos de cidadania básicos à população negra no Brasil e que a gente resolva esse problema não apenas no sentido superficial, mas que a gente seja capaz de refletir sobre as estruturas que perpetuam e que tornam possível e que lucram com a existência do racismo ainda hoje.”
A professora continuou o seu relato: “fui bolsista a minha vida inteira, em escolas particulares da cidade, inclusive os donos eram pessoas negras, e estudei o 1º ano do ensino médio numa escola pública, no Instituto de Educação Gastão Guimarães, e depois dei prosseguimento aos meus estudos na rede particular. Um homem negro sofre principalmente com a questão da violência policial, da dificuldade de acesso à escolaridade, a gente vê que as mulheres negras, apesar de tudo, tem mais acesso à questão da escolaridade. Então, são duas questões que se articulam aí: gênero e a questão do pertencimento étnico-racial; não é que um sofra mais e outro sofra menos, mas que são consequências, desdobramentos diferentes de um mesmo processo, sobre homens negros, mulheres negras.”
“Já sofri tanto injúria racial, quanto crime de racismo, quanto o racismo mais difuso, mais difícil de você detectar, que é o institucional e, se a gente pensa na dimensão estrutural, o racismo estrutural, que eu já passei, vivenciei todas essas etapas das práticas de racismo. Em sala de aula, por parte de professores, por professores colegas de profissão, superiores, infelizmente isso é bastante comum e é algo bastante dissimulado também. E o que torna difícil a gente firmar determinados posicionamentos em relação a isso, por ser uma prática tão recorrente e existe todo um jogo de subterfúgios e de estratégias utilizadas pra fugir às devidas caracterizações. O racismo institucional acontece, por exemplo, quando alguém limita que determinadas discussões da temática racial sejam desenvolvidas no ambiente da sala de aula, ou até quando, por exemplo, um colega não te reconhece como um colega de profissão porque você tem, porque você usa tranças ou porque o seu corpo, os seus traços desmentem aquilo que o teu currículo diz. Então isso é bastante comum com professores negros e isso foi bastante comum durante toda a minha trajetória. Lembro de um episódio mesmo em que estava dando aula e um outro professor me viu sentada na cadeira dando aula pra turma e ele perguntou: ‘e ela é a professora?’ Mas porque não seria eu a professora? Qual seria o motivador dessa dúvida em relação ao fato de eu ser ou não a professora? A gente sabe que os motivos são evidentes, o corpo não diz porque é um corpo negro historicamente relacionado a outros valores, então não poderia estar ocupando o espaço da docente. Infelizmente, isso é bastante recorrente. Houve um caso recentemente na Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), que um aluno se recusou a receber um texto da mão de uma professora negra. Isso não aconteceu no Rio Grande do Sul, isso não aconteceu em outras regiões em que a presença negra não é tão marcante. Isso, infelizmente, é uma prática muito comum.”
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Foto Arquivo pessoal
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